quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

FELIZ A SEU MODO

Eu estava em plena adolescência quando assisti no cinema o filme "Mulher Nota 10" com uma estreante chamada Bo Derek. A comédia contava a história de um cantor que um dia viu uma loira espetacular vestida de noiva e ficou obcecado por ela. O que essa mulher tinha de nota 10? Que eu lembre, só um tremendo corpaço. Mas foi o que bastou para eu e mais umas tantas meninas da minha idade desejarem ser 10 também. Mal sabíamos que estava em curso uma revolução que iria nos exigir muito mais do que um corpaço: iria nos exigir independência financeira, atitude, cultura, talento, sucesso profissional, inteligência acima da média, um bom casamento, filhos notáveis, um farto círculo de amigos, um apartamento bem decorado, uma ótima mão para a cozinha, conhecimento sobre política, economia, artes plásticas, jardinagem e comércio exterior, máxima feminilidade, um guarda-roupa de matar de inveja, um rosto lisinho, um cabelo lisinho, dotes sexuais de humilhar o Kama Sutra e, claro, para agüentar o tranco, um corpo de parar o trânsito. Nem titubeamos. Parecia fácil. Daríamos conta. E demos.> Até que descobrimos que tínhamos tudo, menos a coisa mais importante do mundo: tempo! Não éramos mais donas dos nossos dias, viramos escravas da perfeição, passamos a buscar a nota 10 em todos os quesitos, feito uma escola de samba, e ganhamos o quê? Um stress gigantesco, aliado a uma certa frustração por não conseguir manter tudo no topo: o casamento, a profissão, os seios. Nunca mais uma escapada de três dias num sítio, nunca mais um matinê num dia da semana, nunca mais passar a tarde conversando na casa de uma amiga, nunca mais deitar no sofá enquanto ouvimos nossa música preferida. Tic, tac, tic, tac. Corra!> O Dia da Mulher foi inventado para lembrar que temos os mesmos direitos e a mesma capacidade que os homens. Proponho que aproveite-se esse dia, e esse mês, e o ano inteiro, para lembrar de outra coisa também: não estamos numa competição. Ninguém está nos avaliando. A intenção não é virar uma campeã, e sim desfrutar a delícia de ser uma mulher feliz, divertida e desestressada. Você lembra das garotas nota 10 da sua sala de aula? Umas chatas. Não aproveitavam a hora do recreio, não deixavam a blusa pra fora da saia, não matavam as aulas de religião, só pensavam em ser exemplares. Pois tiveram o mesmo fim da Bo Derek: nunca mais se ouviu falar delas.> Proponho uma pequena subversão nesse Dia da Mulher: seja exemplar pra você mesma e mais ninguém. Faça tudo o que deve fazer, mas também dedique-se ao lazer. Não brigue com o espelho: ter saúde é a beleza necessária. Trabalhe no que lhe dá gosto, aprenda a dizer não, invente sua própria maneira de ser, e se for gorda, fumante, esquisita e sozinha, qual o problema? Aliás, sendo você mesma, dificilmente ficará sozinha. Homem gosta de mulher autêntica, artigo em extinção no mercado.> Depois da revolução feminista, que tantos benefícios nos proporcionou, está na hora de nos rebelarmos contra a tirania de sermos nota 10 e procurar se contentar - ficar contente mesmo! - com uma nota sete, oito, oito e meio. Já é suficiente pra passar de ano e nos dará tempo de sobra para buscar uma vida mais alegre e descomplicada. Nada mais revitalizante do que se permitir errar de vez em quando e não se condenar por causa disso. Abaixo a mulher nota 10, é hora e vez das mulheres imperfeitas, infinitamente mais felizes e reais.

"Martha Medeiros, escritora, colunista dos jornais O Globo e Zero Hora, 18 livros publicados, entre eles os romances "Divã" e "Tudo que eu queria te dizer".

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